Por Daniel Pereira e Adriano Ceolin, Veja
A presidente Dilma Rousseff enfrenta um momento inédito de
fragilidade. Além de ter problemas na economia, como o crescimento baixo, a
inflação persistente e o desmantelamento do setor elétrico, ela perdeu apoio
popular e força para barrar, no Congresso, iniciativas capazes de desgastá-la.
A aprovação ao governo caiu a um nível que, segundo os especialistas, ameaça a
reeleição. Partidos aliados suspenderam as negociações para apoiá-la na corrida
eleitoral. Já os oposicionistas conseguiram na Justiça o direito de instalar
uma CPI para investigar exclusivamente a Petrobras. Acuada, Dilma precisa mais
do que nunca da ajuda do PT, mas essa ajuda lhe é negada. Aproveitando-se da
conjuntura desfavorável à mandatária, poderosas alas petistas pregam a
candidatura de Lula ao Planalto e conspiram contra a presidente. O objetivo é
claro: retomar poderes e orçamentos que foram retirados delas pela própria
Dilma. A seis meses da eleição, o PT está rachado entre lulistas e dilmistas —
e, para os companheiros mais pragmáticos, essa divisão, e não os rivais Aécio
Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB), representa a maior ameaça ao projeto de
poder do partido.
Com carreira política construída na resistência à ditadura
militar e posteriormente no PDT, Dilma nunca teve alma petista. Ao assumir a
Presidência, ela herdou boa parte da cúpula do governo Lula, como ministros,
dirigentes de estatais e até a então chefe do escritório da Presidência em São
Paulo, Rosemary Noronha. O governo era de continuidade mesmo nos nomes
escalados para comandar o país. O plano de Dilma era dar uma feição própria à
sua gestão de forma gradativa, reduzindo a influência do antecessor ao longo do
tempo. Antonio Palocci, seu primeiro chefe da Casa Civil, ilustrou a
estratégia: “No primeiro ano de mandato, será um governo Lula-Dilma. No
segundo, um governo Dilma-Lula. No terceiro, será Dilma-Dilma”. Esse
cronograma, no entanto, foi atropelado pelos fatos. Já em 2011 a presidente foi
obrigada a demitir seis ministros acusados de corrupção e tráfico de influência
— quatro deles egressos do governo anterior. Dilma se mostrava intransigente
com os malfeitos, ao contrário de Lula, acostumado a defender políticos
pilhados em irregularidades. Com a chamada faxina ética, ela atingiu recordes
de popularidade e conseguiu força para tirar das mãos de notórios esquemas
partidários setores estratégicos da administração. Nem mesmo o PT foi poupado
nessa ofensiva.
O partido perdeu terreno em fundos de pensão e na Petrobras,
que teve sua diretoria reformulada em 2012. A faxina ética era acompanhada da
profissionalização da gestão. Com essas mudanças, muitos petistas estrelados,
como o mensaleiro preso José Dirceu, perderam influência. Havia um
distanciamento crescente entre a presidente e a engrenagem partidária, mas Lula
mantinha o PT unido e silencioso. Ele alegava que a “mídia conservadora” — ao
exaltar as demissões promovidas pela sucessora, com o intuito claro de atacá-lo
— ajudava Dilma a conquistar eleitores que historicamente tinham aversão ao PT.
Ou seja: a comparação entre os dois beneficiava o partido. Se alguns petistas
registravam prejuízos em casos isolados, o conjunto estava sendo fortalecido.
Esse discurso manteve a companheirada sob controle até 2013, quando a
popularidade da presidente despencou devido à inflação e às manifestações
populares de junho. Petistas, então, passaram a criticar Dilma, conspirar
contra ela no Congresso e defender a candidatura de Lula. A cizânia interna se
desenhava, mas ainda era incipiente e restrita aos bastidores. Esse dique foi
rompido pelo escândalo da Petrobras.
Hoje, o PT testemunha uma batalha pública e cruenta entre a
soldadesca dos dois presidentes. Palocci não previu, mas o último ano de
mandato também tem seu epíteto: governo Dilma versus Lula.
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