sábado, 31 de outubro de 2015

MOVIMENTAÇÕES FINANCEIRAS SUSPEITAS

Da Época
Há duas semanas, analistas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras, mais conhecido pela sigla Coaf, terminaram o trabalho mais difícil que já fizeram. O Coaf, subordinado oficialmente ao Ministério da Fazenda, é a agência do governo responsável por combater a lavagem de dinheiro no Brasil. Reúne, analisa e compartilha com o Ministério Público e a Polícia Federal informações sobre operações financeiras com suspeita de irregularidades. Naquela sexta-feira, dia 23 de outubro, os analistas do Coaf entregavam à chefia o Relatório de Inteligência Financeira 18.340. Em 32 páginas, eles apresentaram o que lhes foi pedido: todas as transações bancárias, com indícios de irregularidades, envolvendo, entre outros, os quatro principais chefes petistas sob investigação da PF, do Ministério Público e do Congresso.
Eis o quarteto que estrela o relatório: Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República, líder máximo do PT e hoje lobista; Antonio Palocci, ministro da Casa Civil no primeiro mandato de Dilma Rousseff, operador da campanha presidencial de 2010 e hoje lobista; Erenice Guerra, ministra da Casa Civil no segundo mandato de Lula, amiga de Dilma e hoje lobista; e, por fim, Fernando Pimentel, ministro na primeira gestão Dilma, também operador da campanha presidencial de 2010, hoje governador de Minas Gerais. O Relatório 18.340, ao qual ÉPOCA teve acesso, foi enviado à CPI do BNDES. As informações contidas nele ajudarão, também, investigadores da Receita, da PF e do MP a avançar nas apurações dos esquemas multimilionários descobertos nas três operações que sacodem o Brasil: Lava Jato, Acrônimo e Zelotes. Essas investigações, aparentemente díspares entre si, têm muito em comum. Envolvem políticos da aliança que governa o país e grandes empresários. No caso da CPI do BNDES, os parlamentares investigam as suspeitas de que os líderes petistas tenham se locupletado com as operações de financiamento do banco, sobretudo as que beneficiaram o cartel de empreiteiras do petrolão.
Ao todo, foram examinadas as contas bancárias e as aplicações financeiras de 103 pessoas e 188 empresas ligadas ao quarteto petista. As operações somam – prepare-se – quase meio bilhão de reais. Somente as transações envolvendo os quatro petistas representam cerca de R$ 300 milhões. Palocci, por exemplo, movimentou na conta-corrente de sua empresa de consultoria a quantia de R$ 185 milhões. Trata-se da maior devassa já realizada nas contas de pessoas que passaram pelo governo do PT. Há indícios de diversas irregularidades. Vão de transações financeiras incompatíveis com o patrimônio a saques em espécie, passando pela resistência em informar o motivo de uma grande operação e a incapacidade de comprovar a origem legal dos recursos.
O Coaf não faz juízo sobre as operações. Somente relata movimentações financeiras suspeitas de acordo com a lei e regras do mercado, como saques de dinheiro vivo na boca do caixa ou depósitos de larga monta que não tenham explicação aparente. O Coaf recebe essas informações diretamente dos bancos e corretoras. Eles são obrigados, também nos casos previstos em lei, a alertar o Coaf de operações “atípicas” envolvendo seus clientes. É obrigação do Coaf avisar as autoridades sobre operações suspeitas de crimes. A lavagem de dinheiro existe para esquentar recursos que tenham origem ou finalidade criminosa, como pagamentos de propina. Não cabe ao Coaf estipular se determinada transação é ilegal ou não. Cabe a ele somente informar a existência dessa transação às autoridades competentes, caso essa transação contenha características de uma operação de lavagem de dinheiro. Foi isso que o Coaf fez no caso do quarteto petista. Cabe agora à PF, ao MP e ao Congresso trabalhar detidamente sobre as informações reveladas pelo Coaf.
Leia na íntegra a reportagem de Thiago Bronzatto na revista Época desta semana que já está nas bancas.
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MINISTRO, SEM INTERFERÊNCIA

Da IstoÉ
Desde que a Lava Jato passou a condenar e levar para a cadeia políticos do PT e empresários graúdos, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não teve mais sossego. Chefe funcional da Polícia Federal, principal braço da Operação que já entrou para a história do País por prender corruptos e corruptores considerados até então inatingíveis, o ministro virou alvo de uma saraivada de críticas – a maior parte delas oriunda do Partido dos Trabalhadores. Nos últimos meses, Cardozo tem sido atacado de maneira inclemente por algo que deveria ser encarado como uma grande virtude sua: não interferir no trabalho dos agentes federais. Num País onde sempre prevaleceu a máxima “aos amigos, tudo; aos inimigos, os rigores da lei”, o zelo do ministro pelo artigo 5º da Constituição brasileira, segundo o qual todos deve ser iguais perante a legislação, nunca deveria ser considerado um demérito. Infelizmente, é o que tem ocorrido.
Na última semana, o bombardeio ao ministro atingiu o seu ápice. Isso porque na segunda-feira 26, véspera do aniversário de 70 anos do ex-presidente Lula, a Polícia Federal cumpriu um mandado de busca e apreensão na LFT Marketing Esportivo, empresa de Luis Cláudio Lula da Silva, filho da estrela máxima do PT. O caçula de Lula é investigado na Operação Zelotes por receber R$ 2,4 milhões de uma empresa suspeita de fazer lobby junto ao Palácio do Planalto para comercializar medidas provisórias em benefício de empresas automotivas. Ao saber da devassa da PF no escritório de seu filho, Lula investiu-se de fúria. Disparou palavrões – todos impublicáveis – a esmo. A interlocutores, responsabilizou a presidente Dilma Rousseff pelas ações classificadas por ele de “indecentes e inaceitáveis” da PF e pelo fato de ainda não ter substituído o atual ministro da Justiça por alguém capaz de segurar o ímpeto dos policiais federais. O que Lula confidenciou intramuros, o presidente do PT, Rui Falcão, extravasou publicamente. Declarou que o filho de Lula estaria sofrendo uma “perseguição inominável, inexplicável” e afirmou haver uma “campanha direcionada para atingir o PT, a Dilma e o Lula”.
Mas há um alento para os defensores intransigentes do pleno funcionamento das instituições e uma má notícia para os que acham que o Estado deve estar a serviço de seus interesses: Cardozo mantém-se firme no propósito de deixar o trabalho da PF, como se diz na gíria, correr solto. Em entrevista exclusiva à ISTOÉ, concedida em seu gabinete na quinta-feira 29, o ministro garantiu que não pretende intervir na maneira de atuar da Polícia Federal. “Como ministro, só intervirei quando houver caracterização de um descumprimento objetivo da lei ou de abuso de poder por parte de policiais. Até agora não recebi nenhuma representação de quem quer que seja no sentido de que algum policial tenha violado algum dispositivo legal”, afirmou. No que depender de Cardozo, a despeito das fortes pressões que vem sofrendo do meio empresarial e político, a lei será “igual para todos”. “O ministro da Justiça não deve jurídica e eticamente tentar controlar uma investigação, dizendo que não se investigue um amigo ou se puna inimigos”, acrescentou. Seu dique de proteção é a Carta Magna. Para Cardozo, o ministro que tentasse controlar uma investigação, não só estaria ferindo a ética republicana, como cometendo um crime. “Quem ocupar esse cargo até pode tentar usar subterfúgios para tentar orientar apurações, como já foi feito no passado.  Mas duvido que hoje, após a conquistada independência institucional da PF, algum ministro consiga fazer isso de forma exitosa e sem ter problemas com a própria Justiça”, defende-se.
Apesar de partir do PT, agremiação mais afetada com as investidas da Lava Jato, as mais duras críticas ao trabalho do ministro da Justiça, Cardozo diz não se incomodar. “Não tenho nenhuma razão para me sentir incomodado. Incomodado deve se sentir quem ao longo do período de sua vida defendeu isso e agora nega o que sempre defendeu”, disse à ISTOÉ. No partido, ao qual é filiado, o ministro é tachado de “egoísta” e “ingrato” por não se importar em proteger os próprios colegas. Cardozo não se faz de rogado. Para ele, o PT tem direito de se manifestar sobre aquilo que acredita, mas “o ministro da Justiça só deve atuar para exigir que a lei seja cumprida”.
Nas últimas semanas, os ataques desferidos a Cardozo extrapolaram as fronteiras do petismo. Ao tentar costurar um acordão com o governo para salvar a própria pele, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), procurou recentemente o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, para pedir que o chefe da Justiça fosse substituído pelo vice-presidente da República, Michel Temer. O recado foi levado a Dilma assim que ela retornou de uma viagem ao exterior. A presidente, que se recusou a rifar seu subordinado na ocasião, cometeria suicídio político se o fizesse agora: demonstraria fraqueza à população num momento de baixíssima popularidade, enfraqueceria uma instituição que ela própria, durante a campanha à reeleição, se vangloriou de ter fortalecido e ficaria marcada nas páginas da história como a mandatária que interrompeu o combate à corrupção e a faxina ética promovida pela PF para atender a interesses nada republicanos de aliados.
Embora os petardos tenham se intensificado nos últimos dias, depois da batida da PF no escritório de Luís Cláudio, as escaramuças entre Cardozo e Lula remontam a 1997, durante o conhecido caso do CPEM (Consultoria para Empresas e Municípios). Naquele ano, prefeituras petistas foram acusadas pelo então militante petista Paulo de Tarso Venceslau de beneficiar uma empresa comandada por Roberto Teixeira, compadre de Lula. O PT resolveu, então, instalar uma comissão de sindicância interna para apurar suspeitas. Integrada por Cardozo, Helio Bicudo e Paul Singer, a conclusão foi a de aplicar uma punição a Teixeira. Lula ficou enfurecido e outro colegiado foi constituído, culminando em decisão oposta: manter o denunciado, Teixeira, e expulsar o denunciante, Venceslau.
Em 2005, quando eclodiu o mensalão, Cardozo e Lula voltaram a ficar em trincheiras opostas. Petistas que discordavam das deliberações da presidência da legenda decidiram fundar uma corrente chamada Mensagem ao Partido, tendo o ex-governador Tarso Genro e Cardozo como principais militantes. O movimento divergente floresceu e tornou-se hoje a segunda maior força dentro da legenda, perdendo apenas para a Construindo um Novo Brasil, na qual militam Lula e Rui Falcão.
Os embates internos, somados a algumas decepções com a política, mexeram com Cardozo. Em 2010, após dois mandatos como deputado federal, ele enviou a seus eleitores uma carta anunciando que não se candidataria mais a cargos eletivos enquanto não houvesse mudança no atual sistema político, com elevados custos políticos e baseados nos atuais moldes de arrecadação de recursos para campanha, que contribuem para toda sorte de desvios. Neste mesmo ano, trabalhou ativamente na primeira campanha presidencial de Dilma. Integrou o núcleo duro da campanha, fazendo parte do trio apelidado como “três porquinhos”, ao lado de Antonio Palocci e de José Eduardo Dutra, por conta da forma física arredondada dos três petistas. Elogiado pela presidente, que o tem na mais alta conta, Cardozo ganhou aliados principalmente no chamado entorno de Dilma.
Para estes, Lula ensaiou, na última semana, um conveniente discurso de rompimento com o governo, se for necessário mais adiante, ao entoar que sua família virou alvo de uma arbitrariedade cometida pela Polícia Federal. “Ele não precisava ter manifestado sua contrariedade por meio de emissários. Bastava ter conversado com Dilma, olho no olho. Ao agir assim, mostra que prepara uma porta de saída, se for o caso”, disse à ISTOÉ um auxiliar da presidente com assento no Palácio do Planalto. Desvinculado da atual gestão, raciocina a mesma fonte, o ex-presidente teria mais facilidade para pavimentar sua candidatura para 2018, sem ter de carregar o ônus dos fracassos do atual governo.
Escaldado, Cardozo fez um movimento destinado a apaziguar os ânimos no final da semana passada. Baseando-se apenas em notícias publicadas em sites da internet, se antecipou e pediu explicações ao diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello. Queria saber por qual motivo Luis Cláudio, o filho caçula de Lula, teria recebido às 23h de terça-feira 27 a intimação para depor na Polícia Federal . Segundo o despacho enviado pelo ministro, o horário seria, “em tese, fora do procedimento usual”. Com a iniciativa, Cardozo estendeu bandeira branca em meio ao ambiente inflamável. Errará, no entanto, quem enxergar no gesto um recuo.
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O MITO E AS VERDADES

Da Veja
Oito anos na Presidência da República fizeram de Lula um mito. Ele escapou ileso do escândalo do mensalão, bateu recorde de popularidade, consolidou o Brasil como um país de classe média e elegeu uma quase desconhecida como sua sucessora. Os opositores reconheciam e temiam seu poder de arregimentação das massas. O líder messiânico, o novo pai dos pobres, o protagonista do primeiro governo popular da história do Brasil encontra-se atualmente soterrado por uma montanha de fatos pesados o bastante para fazer vergar qualquer biografia - até mesmo a de Lula. Investigações sobre corrupção feitas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público vão consistentemente chegando mais perto de Lula. Ele próprio é foco direto de uma dessas apurações. Do seu círculo familiar mais íntimo ao time vasto de correligionários, doadores de campanha e amigos, o sistema Lula é formado predominantemente por suspeitos, presos e sentenciados. Todos acusados de receber vantagens indevidas de esquemas bilionários de corrupção oficial.
O mito está emparedado em verdades. Lula teme ser preso, vê perigo e conspiradores em toda parte, até no Palácio do Planalto. Chegou recentemente ao ex­-presidente um raciocínio político dividido em duas partes. A primeira dá conta de que sua derrocada pessoal aplacaria a opinião pública, esse monstro obstinado, movido por excitação, fraqueza, preconceito, intuição, notícias e redes sociais. A segunda parte é consequência da primeira. Com a opinião pública satisfeita depois da punição a Lula, haveria espaço para a criação de um ambiente mais propício para Dilma Rousseff cumprir seu mandato até o fim. Nada de novo. A política é feita desse material dúctil inadequado para moldar alianças inquebrantáveis e fidelidades eternas.
Os sinais negativos para Lula estão por toda parte. Uma pesquisa do Ibope a ser divulgada nesta semana mostrará que a maioria da população brasileira condena a influência de Lula sobre Dilma. Some-se a isso o contingente dos brasileiros que até comemorariam a prisão dele, e o quadro fica francamente hostil ao ex-presidente. O nome de Lula e os de mais de uma dezena de pessoas próximas a ele são cada vez mais frequentes em enredos de tráfico de influência, desvios de verbas públicas e recebimento de propina. Delator do petrolão, o doleiro Alberto Youssef disse que Lula e Dilma sabiam da existência do maior esquema de corrupção da história do país. Dono da construtora UTC, o empresário Ricardo Pessoa declarou às autoridades que doou dinheiro surrupiado da Petrobras à campanha de Lula à reeleição, em 2006. O lobista Fernando Baiano afirmou que repassou 2 milhões de reais do petrolão ao pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula e tutor dos negócios dos filhos do petista. Baiano contou aos procuradores que, segundo Bumlai, a propina era para uma nora do ex-presidente. A relação de nomes é conhecida, extensa e plural - dela faz parte até uma amiga íntima de Lula. A novidade agora é que a lista foi reforçada por um novo personagem. Não um personagem qualquer, mas Luís Cláudio da Silva, um dos filhos do ex-presidente. O cerco está se fechando.
Com reportagem de Hugo Marques e Pieter Zalis, leia na íntegra a reportagem de Veja que já está nas bancas.
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DIANTE DOS OLHOS

Artigo de Marina Silva
Fascina-me o exemplo daqueles que, em todos os tempos, são capazes de sonhar com um mundo sustentado por ideais, dedicar a vida a realizar este sonho, fazer dele a metáfora concreta de elevados valores éticos e de um ideal de fraternidade tão antigo quanto a própria humanidade. Por isso, tem sido difícil, até doloroso, suportar a frequência com que o pesadelo – expresso na palavra distopia – tem habitado o cotidiano e o imaginário de nossa sociedade nos últimos anos.
Algumas distopias são, devemos reconhecer, belas obras de arte. Criticam e alertam, ao modo das profecias, mostrando o lugar terrível onde os erros que cometemos nos levarão, caso insistamos em permanecer neles. Mas fora das artes, a má notícia e o anúncio do desastre não parecem produzir efeito prático.
Quando a distopia se instala e o anunciado se antecipa, a sociedade e seus poderes constituídos parecem não crer no que está diante dos olhos. Fiquei impressionada ao saber de um estudo encomendado em 2009 pelo governo de São Paulo sobre a possibilidade de uma crise hídrica. O relatório tinha linguagem próxima à da ficção científica. Situava-se em 2020 e descrevia uma grave falta de água como continuidade de crises “anteriores”, em 2015 e 2018. A criatividade dos cientistas não me impressionou tanto quanto a insensibilidade de alguns governantes, que não leram ou não acreditaram no que estava escrito.
Os relatórios do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) são claros e os alertas dos cientistas são frequentes. Até o papa Francisco clamou por medidas reais e urgentes contra o aquecimento global. Para quem não dá atenção às palavras, mesmo às mais qualificadas do ponto de vista ético ou técnico, aí estão os fatos em imagens chocantes veiculadas todos os dias.
É impressionante ver que cerca de um milhão de refugiados pediram asilo na Europa desde 2014, a maioria fugindo da guerra na Síria e Iraque, deixando toda uma vida para trás. E essa é apenas uma parte do sofrimento humano. Segundo a ONU, o número de refugiados do clima já supera com folga o de refugiados da guerra. Um relatório de 2008 anunciava que poderiam chegar a 50 milhões em 2020. Números mais recentes anunciam 40 milhões por ano, pois os eventos climáticos extremos estão ocorrendo com mais frequência.
Sobre algumas catástrofes imprevisíveis, como tsunamis e terremotos, não é possível determinar que sejam intensificadas pelas mudanças climáticas. Mas outro processo mais lento, igualmente devastador, que gera extremos de desertificação, inundações e furacões, pode forçar deslocamentos humanos em massa. Para estes há previsibilidade e um elevado grau de certeza de serem provocados pelo aquecimento global.
O que os governos esperam além de palavras e fatos? Muitos cobram da ciência uma certeza que não existe em nenhum campo do conhecimento. O cientista Antonio Nobre tem reclamado com razão. É dele a comparação “ninguém faz uma apólice de seguro por ter certeza de que vai sofrer um acidente, basta que haja a possibilidade”. Os estudos mostram mais que um risco, mas uma realidade já visível.
As transformações estão se intensificando e muitas regiões deixarão de ser habitáveis. A ONU estima que, se a elevação do nível dos oceanos tornar-se realidade, poderemos ter entre 250 milhões e um bilhão de refugiados ambientais até 2050. Se a temperatura do planeta aumentar além do limite de 2º C, os ciclos bioquímicos que dão suporte à vida na Terra podem ficar comprometidos. E muitos cientistas dizem que manter-se nesse limite já é um sonho perdido.
Não chega de distopia? Se ainda não dá para sonhar, ao menos podemos ter esperança de que a humanidade esteja sentindo a urgência e o perigo. Existe um sinal de alerta, que tenta acordar a civilização de um pesadelo de consumismo e violência. Pode ainda existir, sob a balbúrdia do trânsito nas cidades, um silencioso compromisso ético com as fontes naturais da vida.
Creio que já temos consciência do quanto é importante a Conferência do Clima da ONU, marcada para dezembro em Paris. Mais de 190 países vão se reunir naquela que talvez seja a última chance para buscar um acordo capaz de reduzir a emissão de carbono ao ponto de evitar consequências mais graves.
Mas os governos ainda dormem. Os compromissos nacionais de redução anunciados até agora pelos principais emissores de carbono ainda estão longe de evitar que cheguemos ao chamado ponto de não-retorno.
No Brasil, nossas maiores fontes de emissão vêm do desmatamento e da geração de energia. Conseguimos grandes resultados na redução do desmatamento desde a implantação do PPCDAM (Programa de Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia), em 2004, mas dados divulgados pelo Imazon indicam a retomada do aumento do desmatamento, o que deverá ser confirmado pelo governo até o fim do ano. No Plano Nacional sobre Mudança do Clima, apresentado em 2008, previa-se eliminar a perda líquida de cobertura florestal no Brasil até 2015, mas isso está longe de acontecer. Em visita à Alemanha, em agosto, a presidente Dilma anunciou a meta de zerar o desmatamento “ilegal” na Amazônia até 2030, uma incrível confissão da incapacidade de fazer cumprir a lei no país.
Se não consegue controlar a perda, como reorientar o desenvolvimento econômico e social para novos ganhos – e de outra natureza -, fazendo a transição para uma economia de baixo carbono? Como levar a algum futuro o país da Amazônia, da Mata Atlântica e do Pantanal, da maior biodiversidade do planeta, o país do sol, da água limpa e do solo fértil, do gigante pela própria natureza?
O Brasil é, de fato, grande. E é importante na superação da crise planetária. Mas terá que agigantar-se em sua renovação ética, erguer-se desde suas raízes históricas e culturais, reconhecer e valorizar sua natureza e os diversos povos que formam seu povo. Só então poderá acordar. E, acordado, sonhar um sonho sustentável.
Artigo publicado no jornal Valor Econômico em 29/10/15 
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FELIZ HALLOWEEN

Charge do Boopo
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EM CENA, UM HOMEM DE MUITAS FACES

Que Lula você prefere? O incendiário ou o bombeiro?
Para quem já se definiu como uma “metamorfose ambulante”, sem compromisso com o que diz o com o que aparenta ser, incendiário e bombeiro são apenas duas faces de uma pessoa de muitas faces, cada uma delas concebida para atender às demandas de determinadas situações.
Como uma pessoa assim pode ser confiável?
Há menos de 20 dias, Lula disse em São Paulo que Joaquim Levy, Ministro da Fazenda, tinha “prazo de validade”. Em seguida, Rui Falcão, presidente do PT e interlocutor frequente de Lula, aconselhou Levy a pedir demissão do cargo caso não estivesse disposto a mudar “os rumos da economia”.
Lula, ontem, em Brasília, estava pianíssimo. Defendeu Levy a quem antes criticava com dureza:
- Tem gente que fala 'Fora Levy' com a mesma facilidade que gritava 'Fora FMI', e não é a mesma coisa. O programa de ajuste já estava feito antes do Levy.
Foi além: defendeu o ajuste que até outro dia criticava.
- A prioridade zero neste País é criar condições para aprovar as medidas que a presidente Dilma mandou para o Congresso, para que se encerre definitivamente essa ideia.
- Não podemos passar mais de seis meses esperando para discutir a CPMF. Nós temos é que começar a votar amanhã se fosse o caso.
O ajuste é mais prioritário do que o impeachment de Dilma e a queda de Eduardo Cunha da presidência da Câmara, segundo Lula.
O que deu no ex-presidente?
Primeiro, ele tem mudado de discurso como quem muda de roupa. Ou porque está testando a construção de uma nova “narrativa” ou porque simplesmente não sabe o que dizer. Por nova “narrativa”, entenda-se a melhor fórmula de se continuar enganando o distinto e ingênuo público.
Segundo, Lula nunca esteve tão acuado como agora. Acuado pelo eleitorado antes cativo de suas artes e manhas, e que começa a abandoná-lo. E acuado pela Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça que investigam as suas e as atividades dos seus filhos.
De uns tempos para cá, política virou negócio no Brasil, mas não só aqui. Os políticos passaram a enriquecer rapidamente. E foi isso o que aconteceu também com Lula. Por oito anos, ele viveu em um apartamento emprestado pelo advogado Roberto Teixeira, seu amigo.
Quem hoje vive de apartamento emprestado por Teixeira são dois dos filhos de Lula. Ele tem apartamento próprio em São Bernardo do Campo, outro na praia do Guarujá em nome da mulher, um sítio reformado de graça pela empreiteira OAS, e dinheiro, muito dinheiro que ganhou a serviço de empreiteiras.
Ao completar 70 anos na última terça-feira, Lula estava furioso com Dilma e com o ministro da Justiça. Acusava os dois de não controlarem a Polícia Federal e de deixarem que ela fosse para cima dele. Deve ter concluído que pouco teria a ganhar com a sua fúria. Travestiu-se então de bombeiro.
Lula clama por ajuda, apenas isso. Está com medo. Não sabe o que poderá lhe acontecer amanhã.
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sexta-feira, 30 de outubro de 2015

MENTIRA DO PT

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, durante fala de mais de uma hora em reunião do diretório nacional do PT nesta quinta-feira, 29, que a mudança de discurso do governo da presidente Dilma Rousseff após as eleições é um dos motivos que faz a atual crise política se arrastar por muito mais tempo. Outro aspecto, acrescentou, é a dificuldade na construção da coalizão política.
"Tivemos um problema político sério, porque ganhamos a eleição com um discurso e depois das eleições tivemos que mudar o nosso discurso e fazer aquilo que a gente dizia que não ia fazer", afirmou. Segundo ele, a construção de uma coalização ampla com vários partidos que, no espectro ideológico são considerados conservadores ou de direita, também contribuiu para prolongar a crise.
"É com essa gente que temos que governar. E são esses companheiros que têm que participar do governo para a gente construir não só a nossa governança, mas a nossa maioria dentro do Congresso", afirmou o ex-presidente, reconhecendo que o "ponto ideal" seria ter ganhado as eleições apenas com partidos de esquerda, "só com companheiros que pensam igual a gente".
Para além da coalizão e da mudança de discurso, o enfraquecimento dos partidos também tem aprofundado a crise política. Na avaliação deles, as direções e os líderes partidários já não têm mais o poder que tinham antes. "Líderes de partidos da Câmara já não conseguem mais liderar sua bancada. Quem está negociando sabe que está muito mais difícil fazer acordo com a direção de partidos ou com os líderes", afirmou o petista.
De acordo com Lula, os partidos funcionam hoje baseados em grupos de interesse. Ele afirmou que "os companheiros" só aceitam acordos após o atendimento a reivindicações, "às vezes uma reivindicação que não é importante". "Lamentavelmente é assim a vida política do País num regime de coalizão", afirmou.
O ex-presidente acrescentou que, nesse contexto, há ainda um "elemento novo", que é a força da influência do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sobre os deputados. "Verdade ou mentira (a força do peemedebista), o dado concreto é que estamos vivendo uma situação de certa estranheza de comportamento no Congresso", afirmou. "E obviamente o PT virou uma espécie de sapinho feio, ou seja, a coisa rejeitada". 
Da Agência Estado, via Diário do Poder
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SALVANDO A PELE

A proposta de resolução aprovada nesta quinta-feira pelo diretório nacional do PT não fala sobre a permanência de Eduardo Cunha na presidência da Câmara e sobre a saída de Joaquim Levy do Ministério da Fazenda, mas apenas de mudanças na política econômica do governo, como aumento da tributação dos extratos da sociedade "mais abastados" e a redução "paulatina da taxa de juros".
O documento da Construindo um Novo Brasil, ala majoritária petista, também faz a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dizendo que ele é alvo de “sabotagem política” e de “armações” por parte de núcleos da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário.
A resolução defende mudanças na política econômica, como a expansão do mercado interno, ampliação dos investimentos estatais, defesa do emprego e “majoração contínua” da renda dos trabalhadores. O PMDB divulgou hoje também a primeira versão de seu programa, intitulado “Uma ponte para o futuro”, no qual sugere várias propostas antagônicas em relação ao PT.
“A recuperação fiscal do Estado deve ser encaminhada com medidas que aumentem a tributação sobre a renda, a riqueza e a propriedade dos extratos mais abastados, ao mesmo tempo em que o governo reduza seus gastos financeiros, através do rebaixamento paulatino da taxa de juros”, diz a resolução do PT.
Clique aqui e leia na íntegra a reportagem no O Globo.
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INCITAÇÃO AO CRIME

A mais nova trapalhada do líder do PT, Sibá Machado (AC), pode render-lhe dor de cabeça. O petista é alvo de um pedido de investigação protocolado na Procuradoria-Geral da República (PGR) nesta quinta-feira pelo PSDB.
Os tucanos querem que Sibá seja investigado por incitação ao crime depois de ele se descontrolar na tribuna da Câmara dos Deputados com um grupo de manifestantes que pedia o impeachment de Dilma Rousseff e, aos gritos, ameaçar agredi-los.
"Eu vou juntar gente e vou botar vocês para correr daqui da frente do Congresso. Bando de vagabundos, vocês são vagabundos. Vamos para o pau com vocês agora", afirmou na última terça-feira.
Na representação ingressada na PGR, o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), afirmou que "ao conclamar essas pessoas não identificadas a agredir os manifestantes, o deputado Sibá Machado, da tribuna da Câmara dos Deputados, incitou essas pessoas a cometerem o crime de lesão corporal com os manifestantes".
O chamamento do petista, de fato, surtiu efeito. No dia seguinte, um grupo de manifestantes do MTST compareceu à frente do Congresso, onde representantes do Movimento Brasil Livre (MBL) estão acampados como forma de protesto pelo afastamento de Dilma. Houve confusão e empurra-empurra e a Polícia Militar teve de ser acionada.
Da  Veja 
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quinta-feira, 29 de outubro de 2015

DELÍRIO TROPICAL

Artigo de Fernando Gabeira
Dilma lembrou-me, esta semana, de uma piada que li na velha revista “Esquire”. Alguém dizia para Nikita Kruschev na ONU: seu alfaiate deveria ser mandado para a Sibéria. No caso de Dilma não é quem faz a roupa, mas a agenda, que deveria passar um tempo na Sibéria. No auge da crise econômica, condenada por um rombo no orçamento que pode ser de R$ 50 bilhões, desemprego em alta, lojas fechando, carros oficiais sem gasolina, ela decide ir à Suécia reafirmar uma compra milionária de caças.
Compreendo que a Aeronáutica precise dos caças e que a opção pela tecnologia sueca tenha sido acertada. Sou, entretanto, de um tempo em que os presidentes analisavam o momento e, em função dele, definiam sua agendas. Qual o sentido, no auge dessa crise, de acenar, de novo, com a compra dos caças de US$ 4,5 bilhões? Não queriam provocar, creio. Talvez tenham pensado que esse gesto de Dilma, posando ao lado dos caças milionários, iria elevar o ânimo da galera no Brasil.
Montada no maior escândalo mundial, gastando US$ 10 mil com a diária, Dilma foi mais longe no seu delírio: deu a entender que tudo foi obra de um homem só, Eduardo Cunha. “Lamento que isso aconteça com um brasileiro.” “No meu governo não há corrupção.” São algumas de suas frases lapidares.
Os fatos diários mostram ex-ministros encrencados com propina (como é o caso de Edson Lobão, Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann), ministros atuais investigados pelo Supremo (Edinho Silva e Aloizio Mercadante), uma Petrobras arruinada, milhões de pessoas nas ruas protestando contra a corrupção. Isso não é com ela, nem com seu governo. É raro um momento histórico em que a verdade dos fatos seja espancada com tanto vigor e cinismo.
Às vezes, a verdade sofre grandes abalos, como mostra Isaiah Berlin em seu ensaio sobre o romantismo alemão do século XVIII. Naquele momento, tratava-se da afirmação de uma verdade subjetiva, uma espécie de inversão, de dentro para fora. Berlin aponta esse momento como um dos decisivos no pensamento ocidental. Os próprios modelos humanos se deslocavam. Saía de cena, o sábio que alcança a felicidade ou a virtude pela compreensão. E entrava o herói trágico que busca realizar a si próprio, a qualquer custo, sem se importar com as consequências. Para Berlin, isso era uma virada quase tão grande como a produzida pelas ideias de Maquiavel, para quem os valores políticos não são apenas divergentes, mas podem ser contraditórios, com os valores cristãos.
O que acontece hoje, no entanto, não me parece uma versão decadente dessas teorias que abalaram o pensamento ocidental. Os franceses descrevem a cara de pau dos políticos com a expressão langue de bois. E a definem como discursos cortados da realidade com o objetivo de manipular o interlocutor. O que acontece, na verdade, me parece um pouco mais com a descrição da linguagem infantil de Jean Piaget. Ele notou que, até uma certa idade, a linguagem das crianças era egocêntrica: falavam sem se preocupar em serem entendidas, falavam para si próprias.
A visão de que a luta política é uma sucessão de narrativas — eu crio a minha, você cria a sua e vamos em frente — acaba dando margem a uma conversa infantil e egocêntrica. Não importa se o outro acredita, essa é a minha verdade. Vou continuar repetindo-a, independentemente dos fatos. Eles são secundários, pois tenho uma narrativa.
Num país onde política e delinquência andam juntas, a atmosfera não está apenas coalhada de versões, mas de álibis. Para entendê-los, valho-me da experiência de repórter policial e não da política. Nesse campo, as negativas costumam ser radicais, como o criminoso que diz que estava fora de si, o corpo desobedeceu a mente.
Paulo Maluf diz que não tem conta na Suíça, a assinatura não é sua. Eduardo Cunha diz que apenas seu advogado pode dizer se tem ou não contas na Suíça. Dilma diz que no seu governo não há corrupção, Lula que não tinha intimidade com o pecuarista José Carlos Bumlai, a quem deu acesso livre ao seu gabinete.
Na verdade, não estão falando para a sociedade, mas para a polícia. Sua linguagem pode me parecer egocêntrica, pelos padrões de uma conversa adulta. Mas é a única que conseguem falar nesse momento. Os suspeitos seguem em cena e a vida do país se degradando, na economia com o desemprego, no meio ambiente com El Niño. Mais de uma centena de cidades do Rio Grande do Sul em emergência. Seca no Sudeste e no Nordeste. Em Minas, aumentou em 77% o número de incêndios em área de preservação ambiental. Três grandes metrópoles — São Paulo, Rio e Belo Horizonte — vão ter menos água ainda. Falar de El Niño nesse universo político é arriscar o álibi uníssono; mas esse filho não é meu. Se as versões são livres, que tal esta, que o poeta Affonso Romano dizia, quando jovem pregador em Minas: “Arrependei-vos, ó raça de víboras, o juízo final está próximo”.
Artigo publicado no Segundo Caderno do Globo em 25/10/2015
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RECORDANDO RACHEL DE QUEIROZ

Hoje, 29 de outubro que se comemora o Dia Nacional do Livro, fez-me lembrar de uma história da escritora cearense, Rachel de Queiroz, relatada em sua autobiografia Tantos Anos, escrita por Rachel e sua irmã caçula, Maria Luiza de Queiroz, em 1998.
Rachel de Queiroz, a pioneira cearense – primeira mulher a entrar na Academia Brasileira de Letras, 1977 – conhecida pelas belas histórias contadas em suas obras, o carinho que tinha pelas palavras, seja nas crônicas, nas peças de teatro ou nos romances, ela era uma mulher à frente do seu tempo. Até na politica Rachel de Queiroz enveredou e teve uma vida intensa.
A consagrada carreira de escritora e jornalista, parte dos brasileiros já conhece, mas, na política é desconhecida pela maioria da população brasileira. Rachel se tornou membro do Partido Comunista ao lado de amigos de sua geração, uma turma politizada e ‘comunizada”, como relatou ela na autobiografia Tantos Anos, de 1998. Foi presa duas vezes.
Em 1931, após passar dois meses no Rio de Janeiro – tinha ido receber o Prêmio Graça Aranha, dado a O Quinze – Rachel volta ao Ceará, com credenciais do Partido Comunista, já politizada e com a missão de promover e reorganizar o Bloco Operário e Camponês, movimento político o qual ela tinha participado.
Rachel passou a fazer parte do Partido Comunista, mesmo sem ter feito uma ficha, assinado alguma ata. Aliás, não se podia deixar nenhum rastro de papéis, livros ou qualquer tipo de documento, a polícia era brutal e se pegasse algum vestígio, levava todos para a cadeia: às pessoas e os papéis. Com a chegada de Getúlio Vargas ao Rio, a polícia ficou mais feroz.
Em 1937, com a decretação do Estado Novo de Getúlio Vargas, os livros de Rachel de Queiroz foram proibidos e, num fato marcante, várias de suas obras acabaram queimadas em praça pública em Salvador (BA), junto a livros de Jorge Amado, José Lins do Rego e Graciliano Ramos, todos classificados de subversivos.
O desligamento do Partido Comunista aconteceu após ela ver censurado pelo próprio Partido o romance João Miguel. No romance, João Miguel, ‘campesino’ bêbado, matava outro ‘campesino’. O aviso: só permitiria a publicação da obra, se Rachel fizesse as modificações apontadas pelo presidente do Partido Comunista. Segundo o Partido, a trama era carregada de preconceitos contra a classe operária.
Jamais se curvou as imposições feitas a sua obra, Rachel de Queiroz não aceitou as tais modificações exigidas pelo Partido Comunista, pegou o original que tinha datilografado e saiu em disparada, como relatado por ela no capítulo O Rompimento, da autobiografia Tantos Anos.
Em sua obra Caminho de Pedras (1937), Rachel trata desse momento político que viveu no Partido Comunista, porque fazer política na década de 20, ser comunista era muito perigoso. A ideia de comunismo era distorcida e alguém que ousasse se apresentar como comunista pagaria um preço alto, até com a própria vida.
Rachel de Queiroz faleceu dormindo em sua rede, em sua casa no Rio de Janeiro, em 4 de novembro de 2003.
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QUATRO LIVROS PROIBIDOS PELA DITADURA

No Dia Nacional do Livro, o Estante Blog aproveita para lembrar de um tempo em que escrever um livro requeria ainda mais coragem. Antes da redemocratização do Brasil, a censura proibiu, processou e recolheu das livrarias cerca de duzentos títulos nacionais. Sob o argumento “da moral e dos bons costumes”, até livros com ilustrações de Pablo Picasso foram tirados de circulação. Felizmente, vivemos uma outra época e a liberdade de expressão é um direito constitucional de todos os brasileiros. Conheça cinco livros que foram proibidos durante os anos de chumbo.
Feliz ano novo, de Rubem Fonseca – Esta reunião de contos de Rubem Fonseca foi proibida de circular em 1976, um ano depois de seu lançamento. As histórias apresentavam críticas sociais e uma ou outra expressão mais chula. Ambos os argumentos foram utilizados para justificar a apreensão dos exemplares. Segundo o parecer dos censores, além da linguagem pornográfica, o livro faz “alusões desmerecedoras aos responsáveis pelo destino do Brasil e ao trabalho censório”.
Zero, de Ignácio de Loyola Brandão – A obra foi publicada originalmente em 1974, na Itália, já que nenhuma editora brasileira quis correr o risco de cair nas garras dos censores. Ela só chegou no Brasil no ano seguinte. Em 1976, foi proibido por ser considerado um atentado à moral e aos bons costumes.
Rosa e José, os protagonistas, vivem uma relação complexa de desprezo e incontrolável desejo. A história de Ignácio de Loyola Brandão, cuja temática é justamente a repressão e o desejo de liberdade, se passa durante a ditadura militar, ou seja, o mesmo período em que o livro foi escrito.
Em câmara lenta, de Renato Tapajós – Esta foi a primeira obra brasileira escrita por um membro da esquerda armada. O autor era filiado ao Ala Vermelha, grupo de influência maoísta que praticou ações armadas. Tapajós cumpriu pena de 1969 a 1974. O livro despertou a fúria de setores conservadores: em julho de 1977, Tapajós foi preso em São Paulo e ficou dez dias incomunicável, sob a acusação de que sua obra era um “instrumento de guerra revolucionária”.
Tessa, a Gata, de Cassandra Rios – Ninguém foi tão censurado pela ditadura quanto Cassandra Rios. Em 1976, ela teve 33 de seus 36 livros proibidos. Comunista? Guerrilheira? Não, senhores. Cassandra escrevia livros eróticos. Imagine se o governo resolvesse recolher todas as cópias de Cinquenta tons de cinza pelo seu conteúdo “subversivo”.
Era o que acontecia com tudo que Cassandra publicava. Os censores alegavam “temas atentatórios à moralidade pública” para vetar livros apimentados, como O prazer de pecar. Tessa, a Gata, por exemplo, chegava a se vangloriar da perseguição na capa.
Abaixo do título, le-se o texto “Um novo sucesso da autora mais proibida do Brasil”. Marketing involuntário à parte, nem tudo eram flores na vida de Cassandra. Homossexual, a autora chegou a ser condenada à prisão por sua orientação sexual.
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terça-feira, 27 de outubro de 2015

FEITO TATUAGEM

O Supremo Tribunal Federal (STF) informou que irá decidir se é constitucional a proibição de certos tipos de tatuagens a candidatos a cargo público contida em leis e editais de concurso público. A questão será analisada no Recurso Extraordinário, interposto por um candidato ao cargo de soldado da Polícia Militar de São Paulo contra acórdão do Tribunal de Justiça local (TJ-SP) que reformou a decisão de primeira instância e manteve sua desclassificação do concurso.
O Recurso, de relatoria do ministro Luiz Fux, teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual e irá definir se o fato de uma pessoa possuir determinado tipo de tatuagem seria circunstância idônea e proporcional a impedi-lo de ingressar em cargo, emprego ou função pública.
No caso dos autos, o candidato obteve, em primeira instância, decisão favorável em mandado de segurança impetrado contra sua exclusão do concurso público para o preenchimento de vagas de soldado de 2ª classe depois que, em exame médico, foi constatado que possui uma tatuagem em sua perna direita que estaria em desacordo com as normas do edital. O Estado recorreu alegando que o edital estabeleceu, de forma objetiva, parâmetros para admissão de tatuagens, mas que o candidato não se enquadrava nessas normas.
O TJ-SP destacou que o edital é a lei do concurso e a restrição em relação à tatuagem encontra-se expressamente prevista. Assim, ao se inscreveram no processo seletivo, os candidatos teriam aceitado as regras. O acórdão salienta que, quem faz tatuagem tem ciência de que estará sujeito a esse tipo de limitações. Acrescenta que a disciplina militar engloba também o respeito às regras e o descumprimento da proibição a tatuagens não seria um bom início na carreira.
Manifestação
Em manifestação quanto à repercussão geral, o ministro Luiz Fux observou que o STF já possui jurisprudência no sentido de que todo requisito que restrinja o acesso a cargos públicos deve estar contido em lei, e não apenas em editais de concurso público. Contudo, explica o ministro, o tema em análise é distinto, pois embora haja previsão legal no âmbito estadual dispondo sobre os requisitos para ingresso na Polícia Militar, a proibição é específica para determinados tipos de tatuagens. No entendimento do relator, essa circunstância atrai a competência do Supremo para decidir sobre a constitucionalidade da vedação, ainda que eventualmente fundada em lei.
"No momento em que a restrição a determinados tipos de tatuagens obsta o direito de um candidato de concorrer a um cargo, emprego ou função pública, ressoa imprescindível a intervenção do Supremo Tribunal Federal para apurar se o discrímen encontra amparo constitucional. Essa matéria é de inequívoca estatura constitucional", salienta o ministro Fux.
O relator enfatiza que o artigo 37 da Constituição Federal (incisos I e II) estabelece que o provimento de cargos públicos efetivos depende de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos e se dará nos termos de lei. Entretanto, pontuou, um alegação genérica de que o edital é a lei do concurso não pode, em hipótese alguma, implicar ofensa ao texto constitucional, especialmente quando esta exigência não se revelar proporcional quando comparada com as atribuições a serem desempenhadas no cargo a ser provido. Segundo ele, é preciso definir se o fato de um cidadão ostentar tatuagens seria circunstância idônea e proporcional a impedi-lo de concorrer a um cargo público.
"A meu juízo, o recurso veicula matéria constitucional e merece ter reconhecida a repercussão geral, haja vista que o tema constitucional versado nestes autos é relevante do ponto de vista econômico, político, social e jurídico, e ultrapassa os interesses subjetivos da causa, mormente diante da constatação da existência de leis e editais disciplinando a restrição de candidatura a cargos, empregos e funções quando se está diante de tatuagem fora dos padrões aceitáveis pelo Estado".
Por maioria, o Plenário Virtual da Corte reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional levantada. Ficaram vencidos os ministros Teori Zavascki, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli.
Do jornal Extra
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sábado, 24 de outubro de 2015

NESSA CANOA FURADA

Artigo de Fernando Gabeira
“Como vai você/ assim como eu/ uma pessoa comum/ um filho de Deus/ nessa canoa furada/ remando contra a maré.” Esses versos de Rita Lee cantados por Marina Lima me vêm à cabeça neste momento da crise brasileira. Uma canoa furada remando contra a maré. Dois personagens centrais brigam pela imprensa. Dilma e Cunha estão numa gangorra. Se um deles parar de repente, o outro voa pelos ares.
Dilma pensa na queda de Cunha, ele pensa na queda dela. Nenhum dos dois parece capaz de realizar esse feito. Para derrubar Dilma é preciso um processo conduzido por alguém que não esteja envolvido no escândalo. Para derrubar Cunha é preciso um tipo de pressão que seus oponentes não fazem.
Na queda de Renan Calheiros, lembro-me bem de que ele não conseguia presidir sessões do Congresso porque os opositores não deixavam. Não sei se isso é possível na atual e sinistra correlação de forças na Câmara. No fundo, seria mais uma paralisia num quadro de desalento e grandes dificuldades econômicas. Esse impasse político faz da retomada do crescimento, ainda que em novas bases, uma outra canoa furada. Com todos os personagens centrais, Renan incluído, tentando se equilibrar, falta energia para pensar no País.
O projeto de Joaquim Levy passa pela CPMF. Mais uma furada. O imposto não será aprovado no Congresso, mesmo se usarem parte dele comprando deputados. Ninguém vende o próprio pescoço num momento em que os eleitores estão atentos. Levy sempre poderá buscar outros meios, como a Cide, de combustíveis, por exemplo. Mas, derrotado com a CPMF, teria força para esse novo movimento? Além disso, há as repercussões inflacionárias.
O ajuste possível e necessário para avançar não tem chance de ser feito. O clima político é de salve-se quem puder. Se fossem personagens de House of Cards, a série de TV americana, até que seria divertido ver o desenrolar de seu destino.
Não canso de lembrar: eles estão aqui, entre nós. Já vamos encolher este ano e em 2016. O número de desempregados cresce e isso é um tema ofuscado pela briga lá em cima da pirâmide.
Outro tema que passa batido são os impactos econômicos do El Niño. As chuvas provocam grandes estragos no Sul e a seca em muitas partes do Brasil é intensa. Pode faltar água nas metrópoles do Sudeste. Com a seca vêm as queimadas. Os incêndios em áreas de conservação em Minas cresceram 77%. São 421 focos. O governo do Estado lançou um plano de emergência de R$ 8 milhões, mas os prejuízos são muito maiores e talvez o dinheiro seja curto. Se computamos os estragos das cheias, da seca e das queimadas, vamos nos dar conta de que estamos num ano de forte El Niño.
No Brasil é um El Niño abandonado. Não houve planejamento. Em Minas o procurador de meio ambiente, Mauro Fonseca Ellovitch, culpa a imprevisão do governo. Mas é um problema nacional. Quem vai cuidar do El Niño com tantas batalhas políticas pela frente?
O fogo comendo aqui embaixo e os malabaristas divertindo a plateia com seus saltos. O PT é o mais sofisticado deles. Resolveu se opor a Joaquim Levy.
Dilma arruinou o País e precisou de Levy para sanear as contas. De modo geral, isso ocorre em eleições, quando o perdedor deixa para trás uma terra arrasada. Mas o PT ganhou as eleições. Se tivesse perdido, ficaria mais confortável na oposição ao ajuste. Na ausência de um governo adversário, o PT coloca um adversário no governo. Sabendo que Levy propõe medidas duras e tende a fracassar, o PT estará com seu discurso em dia.
O movimento é mais sutil porque tenta atribuir todas as dificuldades do momento à política de Levy, mascarando o imenso rombo deixado pelo próprio governo. Duvido que Dilma e o PT não tenham combinado o clássico movimento morde e assopra. Tanto ela como o PT precisam de Levy: ela para acalmar os mercados e o partido para bater nele.
Outra figura polivalente para o PT é o próprio Eduardo Cunha. Derrubá-lo ou não derrubá-lo? É preciso um bom número de deputados do partido para assinar o pedido no Conselho de Ética. E um bom número para ficar calado, uma tática de não agressão. É preciso ser contra Cunha e trabalhar nos bastidores para mantê-lo. Enquanto encarnar a oposição no Parlamento, Cunha será apenas um roto falando do esfarrapado.
Em Estocolmo, Dilma alvejou Cunha, referindo-se ao escândalo: pena que seja com um brasileiro. É um pequeno malabarismo para reduzir o maior escândalo da História a um samba de um homem só. Ainda assim, os aliados acharam que foi um movimento de guerra. Talvez tenha sido inábil no quadro de um acordo de paz, em que ninguém derruba o outro.
Dilma foi à Suécia ganhar o Prêmio Nobel de inabilidade. Foi inspecionar os objetos mais caros que o Brasil comprará: os caças de US$ 4,5 bilhões. Nada contra a Aeronáutica nem contra os caças suecos. Vivemos na penúria perdendo empregos, lojas fechando, cortes de gastos. Recém-condenada pelo TCU por esconder um rombo no Orçamento, ela escolheu como gesto político reafirmar a compra dos caças. E nos deixou como consolo o corte de 10% no salário dos ministros.
Os tempos mudaram tão rapidamente que já não consigo entender a lógica das agendas presidenciais. Alguém deve ter dito: vamos dar uma resposta ao TCU posando diante dos caças suecos, isso levanta o ânimo da galera. Depois de pedalar, Dilma entra num caça. Recentemente, testou um carro sem piloto. Ela parece gostar de veículos, movimento. Amante da poesia mineira, corre o risco de parafrasear Drummond: no meio do caminho, havia um trator.
Para muitos, o processo ainda parece dar-se num universo distante e autônomo, como se fosse mesmo um programa de TV ao qual se pode assistir, mas não alterar o seu curso. Aos que não acreditam nisso, resta a esperança da ação, a certeza de que presidentes caem e sistemas políticos perversos como o brasileiro podem ser reformados.
Ainda que palhaços e malabaristas nos divirtam, será preciso botar fogo no circo.
Artigo publicado no Estadão em 23/10/2015
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O MINISTRO REBAIXAXO

Da Época
Era noite de quarta-feira, 30 de setembro, no Palácio da Alvorada. Mas não uma noite qualquer. Cansada, a presidente Dilma Rousseff ouvia as instruções daquele que pavimentou por duas vezes sua entrada no cargo máximo da República. Lula dava os últimos retoques na composição ministerial que seria anunciada no dia seguinte. Havia escolhido seus homens para os cargos-chave: Jaques Wagner ocuparia a Casa Civil, Ricardo Berzoini, a Secretaria de Governo, e, mais importante, Aloizio Mercadante seria escanteado para o Ministério da Educação, no lugar do breve Renato Janine Ribeiro. O ex-presidente voltava a emplacar seus soldados mais fiéis no núcleo duro do governo. Faltava apenas uma mudança – que Lula, pacientemente, enxertava na cabeça da sucessora: tirar Joaquim Levy do Ministério da Fazenda e substituí-lo por Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central. “Você sabe que não gosto dele. Você sabe disso”, disse a presidente, referindo-se a Meirelles, seu desafeto desde os tempos em que ocupava a Casa Civil. Lula, que conhece a alma de Dilma, arrematou: “E você lá gosta do Levy?”. A resposta de Dilma foi um misto de contração facial e dar de ombros que bem situa o ministro no ranking afetivo da presidente. Escalado para ser o general do ajuste fiscal, Levy viu sua patente de negociador com o Congresso decair a ponto de ele ser visto hoje como um soldado com uma missão apenas: costurar uma peça orçamentária crível.
Lula já afirmou a interlocutores que não vê em Levy a estatura necessária para o cargo. Mas admitiu a Dilma que a saída do ministro não seria conveniente de imediato, devido à instabilidade que isso causaria. Seria melhor, na avaliação do ex-presidente, que a troca se desse no início do ano que vem, com o imbróglio sobre o Orçamento de 2016 minimamente solucionado. Aí, outro titular tomaria a frente das negociações de pautas econômicas com o Congresso, sem o desgaste já acumulado por Levy. Piloto da articulação econômica do governo no início do segundo mandato, o ministro enveredou numa trajetória de sucessivas derrotas – causadas, em parte, pela falta de traquejo político –, a ponto de mesmo seus entusiastas já começarem a defender, nos bastidores, sua saída.
Os poucos parlamentares do PT e da base governista que antes reconheciam o ministro como baluarte do governo na tentativa de enfrentar a crise, agora já não veem com maus olhos seu abandono. “O problema do Levy é tomar banho de mar na praia errada. Ele não dialoga com o governo nem com o Congresso. O linguajar técnico é importante, mas a forma como se passa a mensagem também é. Ele não percebe isso”, diz um parlamentar que até o início de outubro defendia o ministro com unhas e dentes pelos cantos da Esplanada. Dialogar é verbo amplo para descrever o que o Congresso espera de um chefe da Fazenda.
Num mundo ideal, a função do ministro seria preparar o arcabouço técnico para a articulação governista conseguir aprovar projetos que considere relevantes para a economia. No Brasil de hoje, com uma presidente fraca e uma base aliada dividida, exige-se de um titular da Fazenda esforços muito maiores. Ele será considerado forte se for capaz de transitar no Congresso com a destreza de um parlamentar, usando como ferramenta de convencimento não apenas tabelas de cálculos, mas, sobretudo, pequenos gestos como uma visita a um gabinete de deputado, para um café despretensioso. Na engenharia da política, atitudes prosaicas podem fortalecer ou dinamitar pontes.
Trecho da reportagem de capa de Época desta semana. Leia a reportagem completa de Época que já está nas bancas.
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LUTA NA LAMA

No último domingo (18), Dilma Rousseff estava em viagem na Suécia e foi questionada se as recentes contas secretas descobertas na Suíça, que estão sendo atribuídas ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afetam a imagem do país.
Ela respondeu apenas que que lamentava que o episódio envolvesse um brasileiro. No mesmo dia, o peemedebista disse que seria "inevitável" mandar uma resposta, e mandou.
A partir daí, os dois passaram o resto da semana se alfinetando através da imprensa. O resultado foi uma luta na lama, já que nenhum dos dois escapa de pedidos de afastamento ou de renúncia.
Tudo começou com o primeiro golpe, em Estocolmo. Clique aqui para ler as frases ditas por Dilma e Cunha, da revista Época.
Da Época
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A VOLTA DA MISÉRIA

Da IstoÉ
É triste de ver. Nos sinais, nas calçadas, debaixo dos viadutos, na periferia ou nos grandes centros, ela volta a se mostrar com uma crueza desconcertante. A miséria tem mil faces e com a crise que assola o País ganha cada vez mais força e destaque na paisagem cotidiana das cidades brasileiras. Ela está estampada nos rostos de flanelinhas, carroceiros, meros pedintes, vendedores de balas, basqueteiros de cadeira de roda, ferramenteiros, mães com filho de colo, ambulantes diversos, desempregados sem teto, um contingente crescente e variado de necessitados que toma as ruas. Institutos atestam que há, hoje, cerca de 90 milhões de brasileiros classificados como miseráveis ou na linha da pobreza extrema – estatisticamente, cidadãos que sobrevivem com uma renda familiar inferior ao salário mínimo. Isso é mais de um terço da população total. Em meados dos anos 70 o numero não passava de 30 milhões e estava concentrado basicamente no campo. Os miseráveis migraram para as metrópoles. Montaram favelas e moradias improvisadas por onde podiam. Na virada do século já somavam perto de 60 milhões de excluídos e, de lá para cá, não pararam de crescer, a um ritmo de 3% ao ano. Nem mesmo os programas sociais implementados por seguidos governos foram capazes de barrar esse avanço e, com o atual corte de despesas na área, o universo tende a explodir.
Um trabalho recém-concluído pelo pesquisador Samuel Franco, do Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade (Iets), com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), aponta que em quase 20% dos lares brasileiros nenhum morador tem atualmente emprego. Em um ano a alta foi de 770 mil famílias sem qualquer membro com rendimento de trabalho formal ou informal e – por tabela – com baixíssimas condições de bancar seus dependentes. A falta de trabalho é a maior chaga que pode acometer uma sociedade. Por trás dela vem o gradual empobrecimento da população. Percentualmente, a parcela dos lares onde ninguém está ocupado passou de 18,6% ao longo de 2014 para 19,3% no primeiro semestre deste ano. No período, quase um milhão de vagas foram sumariamente extintas. E muitos dos dispensados passaram a engrossar o mafuá dos cruzamentos, montando um verdadeiro pit stop de comércio persa nas esquinas, praças e avenidas. A pobreza fora de controle, com milhares de indivíduos sem perspectiva ou condições de sustento, retrata o Brasil desses dias, que mergulha na maior recessão dos últimos 25 anos.
Há dez meses Adilson de Souza Catarino, 39 anos, perdeu seu emprego como jardineiro na paróquia de Embu das Artes, cidade na Grande São Paulo. Continuou procurando vaga na área, mas só ouviu negativas. Depois que parou de receber o seguro-desemprego, e sem perspectiva de trabalho, não teve como bancar o aluguel e foi para as ruas do Centro de São Paulo. A mulher e os dois filhos estão em Minas Gerais, estado natal de Catarino. Sem perspectiva, ele faz um curso gratuito de pedreiro para conseguir uma colocação. “Quero retomar minha vida. Mas sem trabalho nem dinheiro, faz como?”, diz. Viver na rua e dormir em albergue tem sido uma experiência arrasadora para Catarino. Ele descobriu um mundo assustador, deprimente e corrosivo para a sua auto-estima. O aluguel que golpeou o jardineiro tem feito outras vítimas, justamente nas localidades mais pobres. Nas favelas, há registros de aumento de mais de 70% no último ano. Em Paraisópolis, por exemplo, na Zona Sul de São Paulo, um imóvel de dois cômodos custava no ano passado entre R$ 300 e R$ 380. Este ano, varia entre R$ 500 a R$ 700. Desempregado há um ano, William da Silva, 42 anos, viu as dívidas se acumularem neste período. Foi removido da casa onde vivia e hoje mora no barraco de três cômodos da sogra, numa favela de São Paulo, com a mulher e os cinco filhos. “Hoje, a principal dificuldade é que tudo está mais caro. Ver seu filho pedir um leite, um pão, uma bolacha e não poder dar marca muito”, diz William.
Entre 2015 e 2016 os brasileiros devem perder cerca de R$ 280 bilhões de sua capacidade de compra, segundo estudo da Consultoria Tendências. É a primeira vez, desde 2004, que se registra recuo do poder aquisitivo após anos ininterruptos de crescimento do consumo. “A última coisa que comprei foi essa geladeira, há um ano e quatro meses”, aponta a alagoana Monica Maria Calixto, 41 anos, em São Paulo há 30, mostrando o eletrônico, desajeitadamente organizado em seu barraco de três cômodos. Desempregada há um ano e três meses e mãe de cinco filhos, ela não consegue mais pagar as contas de luz e de água. “Se for pagar, como vou dar de comer aos meus filhos? Fiz o cadastramento para receber o Bolsa Família em fevereiro e não recebi ainda”, diz a ex-auxiliar de limpeza que estudou até a quinta série do Ensino Fundamental, estava no mesmo emprego, com carteira assinada, há sete anos, e não consegue se recolocar. A queda de renda e de possibilidades, que atinge todas as camadas sociais, ganha contornos dramáticos na base da pirâmide onde se situam principalmente aqueles brasileiros com baixa escolaridade. Nesse universo, os demitidos da crise em vigor, com limitadas chances de recolocação, partem para fazer bicos aqui e ali. Das mais variadas maneiras. De preferência tomando as ruas, onde não é preciso esperar pela oferta de chefes e patrões, que desapareceram por esses dias. Catadores de papel, quinquilharias e latinhas, recicláveis de qualquer natureza, com suas carroças abarrotadas de peças que ninguém quer mais, aumentaram numa quantidade incomum. Segundo o Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis, há atualmente 800 mil catadores em atividade, 65% deles mulheres. A entidade acusa um aumento de 15% no último ano no número de pessoas nessa função. E a oferta dessa mão-de-obra, aliada ao custo dos compradores, fez cair o preço da sucata, exigindo jornada dobrada daqueles que se aventuram na atividade.
Sandra Regina Ferreira Cezarina, 31 anos, é uma das mulheres que engrossaram as estatísticas dos catadores de latinhas. Demitida do emprego de auxiliar de limpeza, e à procura de trabalho há meses, passou a viver de catar recicláveis, o que lhe rende de R$ 60 e R$ 100 por mês. Junta a esse valor o Bolsa Família de R$ 112 da filha e é essa a renda da família de dez membros. Moradora em uma favela de São Paulo, Sandra vive num barraco de três cômodos – cozinha com apenas um fogão, banheiro e quarto com um berço e um colchão – com o marido também desempregado e oito filhos. “Minha maior dificuldade hoje é garantir o pão e o leite no dia seguinte. Arroz e feijão não consigo comprar todo dia”, diz.
A disputa também é grande entre vendedores de alimentos. Nas feiras, nas barracas, no isopor. Com a mudança de estação, a cada dia mais quente, evapora a podridão de verduras, frutas, doces que se deixam cair na ânsia de convencer com rapidez os transeuntes. Depois de trabalhar durante 15 anos como segurança, José Luciano da Silva, 44 anos, sofreu um acidente de carro em dezembro e foi afastado do trabalho. Sem dinheiro e com a mulher também fora do mercado, decidiu vender frutas em uma das vias mais movimentadas da zona oeste de São Paulo. “Tendo um preço bom e sabendo trabalhar, dá para sobreviver” , diz. Silva trabalha das 6h às 20h, de segunda à sexta-feira, mesmo com o braço imobilizado por causa do acidente. Vende frutas a valores bem abaixo dos praticados na região – uma dúzia de banana sai por R$ 4 e um suco de 300ml de melancia, que na padaria mais próxima custa R$ 5,50, vende a R$ 2. Os limpadores de vidro que oferecem seus serviços nos semáforos são outros que se avolumam nas metrópoles. Everton Auto Ferreira da Silva, 28 anos, foi demitido de uma metalúrgica em 2013 e viu a rua como única alternativa. Tinha carteira assinada, um salário de R$ 1,2 mil, mulher e dois filhos pequenos, mas hoje, com todos os problemas que a demissão lhe trouxe, está separado e mal vê as crianças. Morador de Guaianazes, bairro no extremo leste de São Paulo, prefere trabalhar no centro da cidade e levar uma hora e meia para chegar até lá porque o movimento de carros é maior. A água e o sabão ele ganha em um posto de gasolina das proximidades. E diz não ver muita cara feia. “A maioria dos motoristas me dá algumas moedas.”
Segundo Pedro Fassoni Arruda, cientista político da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, houve uma estagnação da redução da pobreza no País em razão da crise econômica. “Quem acaba pagando o custo são os mais pobres e a condução da atual política econômica sinaliza um aumento da pobreza. Acredito que há uma tendência para voltarmos a uma situação de precariedade.” Mas não é preciso consultar estatísticas ou tratados de sociologia para perceber que a miséria espreita a cada esquina e vai, de novo, rapidamente, mudando o cenário nas cidades brasileiras. Ela não se esconde mais nas favelas, cortiços ou áreas invadidas. Em qualquer lugar público estão lá seus protagonistas. E eles se multiplicam com o cair da noite. Aparecem de uma hora para a outra com cobertores, cadeiras e parcos utensílios para se acomodar em todo canto, debaixo das marquises ou nos bancos disponíveis. São inúmeros esses agrupamentos humanos, esparramados nos túneis e becos, que viraram rotina e transformaram os grandes centros urbanos num território de desesperados sociais. O fenômeno não é exatamente novo, mas há de se lamentar o fato de seu retorno e recrudescimento após a conquista da estabilidade do real e a promessa do surgimento de uma nova nação. O corte de R$ 9 bilhões, ou 50% do que foi gasto em 2014 no Programa Minha Casa, Minha Vida e nos projetos de educação como o Pronatec (corte de R$ 2,3 bilhões) e Ciências sem Fronteiras (corte de R$ 2 bilhões) só agravam ainda mais o processo de avanço dos excluídos. “A crise pode aumentar a população de rua”, diz Sônia Rocha, economista do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade e autora de “Transferências de Renda no Brasil - O Fim da Pobreza?”. “Pessoas mais vulneráveis acabam indo para as ruas empurradas por condições sócio econômicas muito graves.”
Pelos critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), a definição de pobreza extrema encontra outros critérios. É baseada na estimativa do valor de uma cesta de alimentos com a quantidade mínima de calorias capaz de suprir uma pessoa. De acordo com essa metodologia, o Brasil também vem registrando, desde 2013, aumento na quantidade de carentes. Eles somariam cerca de 30 milhões de brasileiros, 11 milhões dos quais na condição de miseráveis, vivendo com menos de R$ 77 per capita por mês, parâmetro estabelecido pelo Programa Brasil Sem Miséria. Nesse campo de análise o índice subiu de 3,6% para 4% da população. Pode parecer pouco em termos percentuais, mas representa um absurdo no tocante a regressão da qualidade de vida nacional. Há pelo menos um par de ano já era possível prever que estava sendo armado no Brasil um desastre social de proporções épicas, fruto direto de políticas, atitudes e decisões erradas por parte do Governo. Também era evidente que iriam faltar recursos para atender cidadãos humildes num país em que o Estado sustenta uma máquina capaz de torrar R$ 214 bilhões em um ano apenas para pagar os salários de seus funcionários. Na semana passada, ministros e políticos aliados voltaram a falar em redução de investimentos, dessa vez no Bolsa Família. Algo como R$ 10 bilhões, ou 35% do total, seriam cortados do Programa na proposta do relator do orçamento federal, deputado Ricardo Barros. A presidente Dilma resolveu barrar a manobra. “O último bastião vai ser mexer no Bolsa Família”, diz Alvaro Martins Guedes, especialista em administração pública e professor da Unesp. “Será tensão social e miséria absoluta.” Alheia às tramas em Brasília, Maria Aparecida Guimarães, 52 anos, vive com a filha e o neto num barraco minúsculo na cidade de São Paulo. Todos os adultos da casa estão desempregados e a família sobrevive com R$ 300 por mês do que chamam de “bicos”. Com isso, não é possível pagar aluguel, água, luz, nada. O pouco que têm vai para o gás e a comida. “Minha vida piorou muito”, atesta dona Maria Aparecida.
Uma coisa é certa: nada tão previsível como a miséria brasileira após anos seguidos de desvios e má gestão das administrações petistas. Logo ela, que empunhava a bandeira do “tudo pelo social”, enterrou a oportunidade de ouro de conduzir o País para um novo papel no concerto das nações. Da mesma forma, nada tão inevitável como a mudança de patamar da miséria por aqui. Durante muito tempo os brasileiros se acostumaram a encarar as favelas dos centros urbanos como símbolos de um padrão miserável de vida. Elas perderam esse status. Mudaram de nome. Viraram comunidades. E a realidade dos últimos anos informa que a favela de outrora deixou de ser para qualquer um. No eixo Rio-São Paulo, por exemplo, o aluguel de um barraco pode chegar a R$ 2 mil. Resultado: cresce a quantidade de pessoas que não têm recursos sequer para morar numa favela, sobretudo nas que hoje contam com casas de alvenaria, luz elétrica e água encanada. Por isso mesmo é que o flagelo humano ganhou às ruas. Deixou de ser visto apenas como um incômodo estético para se converter numa terrível demonstração de abandono do compromisso oficial de erradicação da pobreza. A reportagem de ISTOÉ encontrou Marcelo Coelho, 45, numa fila para ganhar um prato de comida, dado pelas irmãs da instituição Madre Teresa de Calcutá, na Lapa, centro do Rio. Eletricista e pai de três filhos, Marcelo trabalhou 1 ano e 6 meses na CSL Siderurgia do Brasil, em Volta Redonda, no Rio de Janeiro, mas foi demitido há oito meses, devido a um corte de custos. Ao tentar a sorte no Rio de Janeiro, foi assaltado logo que chegou, e ficou sem documentos. Encontrou apoio na Instituição Madre Teresa  de Calcutá, que ajuda dando roupas e alimentação.  “Durmo na rua, onde der, mas não deixo de procurar emprego. Nessa condição de miséria, o sujeito fica sem dinheiro para tudo. É muita humilhação para quem já teve um lar, uma família, um trabalho”, diz Coelho, que mandou os filhos para a São Paulo, na casa do sogro.
Discutia-se no passado como dividir o bolo da riqueza no País. Esse debate foi superado com a estabilização da moeda, ainda na era FHC, e a criação de programas como o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e Fome Zero, reunidos todos eles depois sobre um mesmo guarda-chuva na gestão seguinte. Por mais exótica que fosse, a sociologia bandoleira de Lula cumpria uma missão. Resgatava para milhares de brasileiros o sentimento de dignidade. Mas a perpetuação da estratégia assistencialista, sem qualquer trabalho adicional no campo da preparação e aprimoramento do indivíduo para enfrentar os desafios do mercado e ganhar o próprio sustento, criou distorções como o nascimento de uma massa de acomodados, pessoas defasadas e dependentes das benesses do governo. Com a escassez em voga dos recursos estatais, muitos desses amparados perderam o chão. E o teto. Passando a habitar calçadões e viadutos.
O problema, com perspectiva de piora, é que hoje em dia existem outros cidadãos disputando esses mesmos lugares. São desempregados da indústria e do varejo, profissionais da construção civil, aposentados maltratados pelas pensões miseráveis da previdência e toda sorte de gente que não tem dinheiro para pagar sequer o quarto de um cortiço. Desempregada há quatro meses, Ládis Rocha Ladislau, 49 anos mostra insistentemente sua carteira de trabalho, um símbolo de dignidade que carrega pelas ruas da Zona Sul do Rio de Janeiro, onde vive. Sem trabalho, sem dinheiro e sem o marido, que a abandonou, ela diz que a irmã e as sobrinhas moradoras do subúrbio também não quiseram recebê-la. Dormindo no bicicletário da Glória, sua rotina é totalmente diferente. “Não lavo roupa: uso até ficar muito sujo e jogo fora. E tomo banho em chafariz. Peço dinheiro e me alimento, a depender da bondade alheia. Mas ninguém gosta de ajudar”, diz a ex-auxiliar de serviços gerais, agora sem rumo depois que perdeu a casa. É cidadã de um país que começou a dar errado bem antes de o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, anunciar seu ajuste fiscal. Diga-se que fosse apenas a moradia sua dificuldade já seria um desafio monumental superá-la. Virar desabrigada é contar com a sorte a cada dia. Inclusive para não ser morto por desconhecidos ou bandidos que imperam nas madrugadas.
Pessoas como Ládis e outros brasileiros citados nesta reportagem podem ser definidas como cidadãos fora das estatísticas oficiais. É que para efeito de registro, os cálculos sobre miseráveis e desabrigados em geral consideram apenas aqueles com endereços fixos, que podem ser localizados. Uma incoerência absoluta! Decorre daí que provavelmente existam muito mais pessoas nessa situação no Brasil inteiro do que estimam os institutos com seus chutes numéricos. Embora o fenômeno epidêmico de moradores de rua esteja mais concentrado em casos clássicos de desajustados – mendigos, alcoólatras irrecuperáveis, drogados e doentes mentais – é fato que muitos ex-empregados estão enveredando por essa alternativa. E até trabalhadores ocupados assumiram essa condição devido os baixos soldos que recebem. A conclusão, aí, é perfeitamente clara. O trabalho, no Brasil, já não é suficiente para evitar que o indivíduo acabe perambulando sem destino pelos grandes centros.
O que chama a atenção é que, em sua fase atual, a pororoca dos necessitados não faz distinção regional. Acomete com igual vigor metrópoles e pequenos municípios. Há um ano, Rosângela da Silva Santos, 37 anos, morava com seus oito filhos em uma casa alugada na cidade de Santa Maria, nos arredores de Brasília. O imóvel era pequeno: apenas um quarto, uma sala, uma cozinha, um banheiro e um quintal. Mas ela diz ter saudades de ter um teto para proteger sua família, “especialmente nos dias de chuva”. Hoje está morando em um terreno baldio do Plano Piloto. No município vizinho, ela trabalhava para uma cooperativa de reciclagem e contava com a ajuda do governo do Distrito Federal para inteirar o aluguel. Perdeu o benefício, não pode mais morar na mesma região e, longe da coleta, ficou desempregada. No terreno, escolheu a sombra de uma mangueira alta, fincou estacas de bambu, cobriu com uma lona preta e forrou o chão de terra batida com papelão. Recentemente, encontrou em um lixão uma mesa e bancos de madeira, que acomodou ao lado do barraco. Lá, seus filhos comem e fazem a lição da escola. O dinheiro que recebe é vindo do Bolsa Família, cerca de R$ 300, e de latinhas que recolhe na rua. “Sinto falta de poder abrir e fechar a porta de casa”, lamenta.. É um dado perverso no sistema brasileiro de desenvolvimento que os R$ 5,74 trilhões de PIB, segundo o Ministério da Fazenda – número inferior aos dos demais anos, mas ainda assim relevante -, não tenham impacto positivo direto na vida dessa significativa massa de aflitos. É um problema que transcende partidos, bandeiras ideológicas e disputas de poder. E que deveria motivar a todos por um grande pacto nacional em busca de saídas imediatas.
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A CRISE ESTÁ NO MEIO

Da Veja
Mais de vinte anos depois do início dos registros históricos de seu tempo na Presidência que surgem em seus diários, Fernando Henrique Cardoso mantém um olhar atento - e crítico - sobre o que se passa em Brasília e no Brasil. O ex-presidente avalia que o país já se distanciou do início da crise, mas ainda não está perto do fim dela. Mesmo que não chegue a cravar que o governo de Dilma Rousseff não tem mais salvação - "em política, o futuro é inventado, não está dado" -, avalia que as chances de recuperação da petista são ínfimas. Guarda as palavras mais duras para seu sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva, que está "enterrando a própria história" por continuar persistentemente a fazer "escolhas erradas". O tucano também dissipa as dúvidas sobre a saída que o PSDB busca para a crise e afirma que o partido defende a cassação da chapa de Dilma, por ter recebido dinheiro do petrolão na campanha, e que vai votar a favor do impeachment quando, e se, a questão do afastamento constitucional da presidente chegar ao plenário da Câmara dos Deputados.
Mas na entrevista de uma hora e meia que concedeu a VEJA em seu apartamento em Higienópolis, na manhã de quarta-feira, o ex-presidente não falou só da atualidade. Expôs os motivos que o levaram a publicar em vida seus diários - um deles foi definir as regras para a edição do gigantesco material se porventura a saúde lhe faltar antes do fim da empreitada - e afirmou que não teme o julgamento da História, tampouco a repercussão da divulgação de suas memórias. "Quem entra para a vida política tem de ter muita firmeza interior. Quando você entra para a política, você é responsável pelos seus atos. Fiz com boa intenção, não roubei, não censurei, não protegi, não persegui."
FHC defende a tese de que tudo o que fez no governo foi porque tinha, e ainda tem, um projeto claro de país. Ele afirma que a virtude do homem público, do "homem de Estado" (termo que usou algumas vezes, sem jamais mencionar a palavra estadista), é conseguir levar adiante seus projetos - não é a mesma virtude individual, não tem a ver com as "verdades íntimas, convicções, ética pessoal".
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ACABOU EM PIZZA

Charge do Alpino

Após oito meses instalada para investigar desvios na Petrobras, a CPI da Petrobras acabou em pizza. Uma grande pizza.
A escolha de Luiz Sérgio (PT-RJ), ex-ministro do governo Dilma, já sinalizava que o resultado seria vergonhoso.
No parecer final de Sérgio, nenhum dos 62 políticos investigados na Operação Lava-Jato aparecem. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha foi poupado pelo petista.
A presidente Dilma, o ex-presidente Lula, Graça Foster e Sérgio Gabrieli também ficaram de fora do seletivo parecer do petista.
O relator preferiu atacar os delatores, para Sérgio, a Petrobras foi vítima do cartel de empreiteiras. 
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NA MINHA REDE NÃO!

O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT) cogita deixar o partido. Nos bastidores, a Rede é o partido que Haddad pretende desembarcar. Haddad, na minha rede não, arranje outra rede ou vá dormir no chão!
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MAIS UMA CONDENAÇÃO

O ex-governador Ciro Gomes terá de pagar uma multa ao líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira, equivalente a dez mil UFIR’S (Unidade Fiscal de Referência).
A decisão é baseada na sentença do desembargador Antônio Abelardo Benevides Moraes em favor do peemedebista. Eunício Oliveira entrou com uma ação contra Ciro Gomes, que usou sua conta pessoal na rede social Facebook para lhe endereçar ofensas.
Ciro descumpriu determinação judicial que previa direito de resposta a Eunício Oliveira.
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sexta-feira, 23 de outubro de 2015

CODINOME 'LINDINHO'

O ex-gerente da Petrobrás, Eduardo Musa, um dos delatores da Operação Lava Jato, afirmou que o apelido do ex-diretor da área internacional da estatal Nestor Cerveró em planilha de propina era ‘lindinho’. Segundo o delator, havia uma tabela com a divisão dos pagamentos ilícitos na Diretoria Internacional.
Eduardo Musa afirmou à força-tarefa da Lava Jato que entrou na Petrobrás em 1978, por meio de concurso público. O executivo disse que ficou na companhia até janeiro de 2009. Em 2003, ele contou que perdeu o cargo que ocupava na gerência geral de Gás e Energia e foi trabalhar na área de Exploração e Produção.
Entre 2003 e 2006, Eduardo Musa afirma ter trabalhado na BR Distribuidora. De 2006 até se aposentar, ele relatou ter sido gerente-geral da área internacional.
“Desde que entrou na Petrobrás se ouvia falar do pagamento de vantagem indevida nas mais diversas áreas, mas somente em 2006 o declarante começou a tomar conhecimento de forma direta”, declarou Eduardo Musa.
“O tema de pagamento de propina foi apresentado ao declarante por Luis Carlos Moreira. Por volta de julho de 2006, quando o declarante estava começando a trabalhar no desenvolvimento do projeto do navio sonda Petrobrás 10000, Moreira mostrou uma planilha de divisão de propinas da área internacional da Petrobrás; nesta planilha constavam codinomes (apelidos); que o apelido de Nestor na planilha era Lindinho.”
Nestor Cerveró já foi condenado em duas ações na Operação Lava Jato. Em maio, o juiz Sérgio Moro, que conduz as ações da Operação Lava Jato, aplicou 5 anos de pena ao ex-diretor, pelo crime de lavagem de dinheiro na compra de um apartamento de luxo em Ipanema, no Rio.
Em agosto, o juiz impôs a Cerveró 12 anos, três meses e dez dias de reclusão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

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NO RODA VIDA

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, estará no centro do Roda Viva, da TV Cultura, nesta segunda-feira (26), às 22h00.
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