Do O Estado de S.Paulo
O uso de caixa 2 na campanha eleitoral de Dilma Rousseff (PT) em 2014 reforçou a percepção de que os políticos brasileiros sofrem de "amnésia moral", disse em depoimento sigiloso à Justiça Eleitoral o marqueteiro João Santana, responsável pelas campanhas do PT à Presidência da República em 2006, 2010 e 2014. Segundo o publicitário, Dilma "infelizmente" sabia do uso de recursos não contabilizados em sua campanha e se sentia "chantageada" pelo empreiteiro Marcelo Odebrecht.
O uso de caixa 2 na campanha eleitoral de Dilma Rousseff (PT) em 2014 reforçou a percepção de que os políticos brasileiros sofrem de "amnésia moral", disse em depoimento sigiloso à Justiça Eleitoral o marqueteiro João Santana, responsável pelas campanhas do PT à Presidência da República em 2006, 2010 e 2014. Segundo o publicitário, Dilma "infelizmente" sabia do uso de recursos não contabilizados em sua campanha e se sentia "chantageada" pelo empreiteiro Marcelo Odebrecht.
De acordo com Santana, a petista teria sido uma "Rainha
da Inglaterra" em se tratando das finanças de sua campanha, não sabendo de
todos os detalhes dos pagamentos efetuados.
No entanto, indagado se a presidente cassada tinha
conhecimento de que parte das despesas era paga via caixa 2, o marqueteiro foi
categórico: "Infelizmente, sabia. Infelizmente porque, ao me dar confiança
de tratar esse assunto, isso reforçou uma espécie de amnésia moral, que envolve
todos os políticos brasileiros. Isso aumentou um sentimento de
impunidade".
O jornal O Estado de S. Paulo apurou mais detalhes do
depoimento de Santana, prestado na última segunda-feira, 24, no Tribunal
Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA). Na ocasião, o ex-marqueteiro de Dilma
lembrou o papel do atual governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT),
como "porta-voz" de recados de Marcelo Odebrecht.
"Dilma se achava chantageada pelo Marcelo",
afirmou Santana à Justiça Eleitoral. De acordo com o relato do publicitário, o
objetivo da chantagem seria intimidar a então presidente a ponto de fazê-la
impedir o avanço das investigações da Lava Jato. Dilma nunca gostou do
"Menino", apelido que usava para se referir a Marcelo Odebrecht,
disse o ex-marqueteiro do PT.
Conforme depoimento do ex-diretor de Crédito à Exportação da
Odebrecht Engenharia e Construção João Nogueira à Procuradoria-Geral da
República (PGR), o ex-presidente da Odebrecht enviou, por meio de Pimentel,
documentos que demonstravam o uso de caixa 2 na campanha da petista. O objetivo
era demonstrar que Dilma não estava blindada na crise de corrupção que se
instalou no seu governo.
Dilma também teria sido avisada reiteradas vezes de que a
sua situação poderia se complicar se ela não barrasse um acordo internacional
entre autoridades do Ministério Público do Brasil e da Suíça, já que a conta da
sua campanha estaria "contaminada".
João Santana foi uma das últimas testemunhas ouvidas no
âmbito da ação que apura se a chapa encabeçada por Dilma, de quem Michel Temer
foi vice, cometeu abuso de poder político e econômico para se reeleger em 2014.
O julgamento do processo deverá ser retomado na segunda quinzena de maio. A
informação de que Dilma sabia do uso de caixa 2 foi considerada um fato novo
pelo ministro Herman Benjamin.
Nefasta
O assunto "caixa 2" foi tratado por Dilma e por
João Santana já em abril e maio de 2014, antes do início oficial da campanha
eleitoral. De acordo com o marqueteiro, o pagamento "oficial" estava
em dia, enquanto os repasses de recursos não contabilizados via Odebrecht
sofriam atrasos.
Santana foi questionado no depoimento se esses atrasos não
seriam genéricos, mas o próprio marqueteiro enfatizou que a demora nos
pagamentos sempre envolve a parte não contabilizada. O publicitário afirmou que
já estava acostumado a dar "alerta vermelho" sobre atrasos, desde a
época em que trabalhou na campanha de Lula à Presidência, em 2006.
"Caixa 2 é uma coisa nefasta", criticou Santana,
que disse não haver campanha eleitoral sem a irrigação de recursos não
contabilizados - mesma constatação que já havia sido feita por Marcelo
Odebrecht em outro depoimento ao ministro Herman Benjamin.
Para o marqueteiro, a definição das coligações em torno de
candidaturas são "leilões", envolvendo uma série de interesses e
negociações, como a distribuição de cargos. "Isso vai perdurar enquanto
tiver empresário querendo corromper e político querendo ser corrompido",
disse. Mesmo considerando Dilma Rousseff uma política honesta, o marqueteiro
reconheceu que a petista acabou "fatalmente nessa teia".
"É um esquema maior que o 'petrolão'. Essa
promiscuidade de público e privado vem do Império, passou por todas as coisas
da República", resumiu Santana.
Defesa
Em nota, a assessoria da ex-presidente Dilma Rousseff
repudiou "o vazamento seletivo de trechos" do depoimento de João
Santana, o que renova "a necessidade de rigorosa investigação pela Justiça
Eleitoral".
"Dilma Rousseff nunca negociou diretamente quaisquer
pagamentos em suas campanhas eleitorais, e sempre determinou expressamente a
seus coordenadores de campanha que a legislação eleitoral fosse rigorosamente
cumprida e respeitada".
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