Peça-chave no suposto esquema de caixa dois da campanha de
Geraldo Alckmin (PSDB) em 2014, o delator Luiz Bueno não foi incluído na
petição contra o governador de São Paulo.
Então chefe da Odebrecht em São Paulo, Bueno teria sido o
responsável por negociar o valor e organizar os repasses a um interlocutor de
Alckmin em 2014, segundo relatos que integram a peça da PGR (Procuradoria-Geral
da República).
O ex-executivo da empreiteira foi apontado por dois outros
delatores como o articulador da operação com Marcos Monteiro, hoje secretário
do governo. A delação de Bueno está em sigilo.
Arnaldo Cumplido, então diretor de contrato da Odebrecht com
a Linha 6 do Metrô de SP, afirmou aos procuradores que Bueno "mandava cada
programação com codinome e o valor".
"O Bueno que me avisava que era para fazer aporte de
recursos na modalidade de caixa dois para a campanha do governador Geraldo
Alckmin", afirmou. "Eu não tinha contato com o governador ou com o
Marcos Monteiro."
Ao final de seu depoimento, o procurador pergunta "quem
saberia explicar em detalhes a contrapartida e o motivo pelo qual os pagamentos
foram feitos". Cumplido responde: "Dentro do que eu imagino, o Luiz
Bueno".
Acima dele estava Benedicto Junior, que era o presidente da
construtora Odebrecht. Em sua delação, ele reforçou o papel central de Bueno na
operação. "Ele [Monteiro] procurou o Luiz Bueno e foram os dois que
acertaram o pagamento", disse.
Segundo os delatores, Alckmin recebeu R$ 8,3 milhões em 2014
e R$ 2 milhões em 2010 não declarados.
O tucano nega. Diz que "jamais" pediu recursos
irregulares nem autorizou que o fizessem em seu nome. "Sempre exigi que
minhas campanhas fossem feitas dentro da lei", afirmou.
Nesta semana, Alckmin voltou a dizer que "é preciso ter
cuidado com delação. Tem muita coisa que não tem nada, nada... Não tem relação
uma coisa com a outra".
A Procuradoria não explicou por que a delação de Bueno não
foi incluída no documento entregue ao Supremo Tribunal Federal nem se observou
discrepâncias entre provas e depoimentos. Observou, contudo, que nada impede a
Justiça de requerer depoimentos de Bueno se for dada sequência ao caso.
INCONSISTÊNCIAS
Há outras lacunas nas delações que implicam o governador de
São Paulo. As planilhas entregues pelos três delatores que embasam a petição
apontam valores diferentes dos informados nos depoimentos.
Benedicto Junior relatou que Marcos Monteiro pediu R$ 10 milhões
para a campanha de Alckmin em 2014, mas que a Odebrecht repassou R$ 8,3
milhões. Como prova, ele entregou sete documentos do sistema usado para
gerenciar as propinas. Somados, os repasses apresentados foram de R$ 6,5
milhões.
Em sua delação, Arnaldo Cumplido apresentou apenas um
documento, que comprova supostamente um único repasse de R$ 500 mil. No
depoimento a procuradores, ele confirmou planilhas citadas pelo Ministério
Público que somavam R$ 6,3 milhões.
Em 2010, quem chefiava a Odebrecht em São Paulo era Carlos
Armando Paschoal. Ele disse aos procuradores que doou R$ 2 milhões por meio de
caixa dois a Alckmin naquele ano, valor repetido por Benedicto Junior.
Mas, de novo, as planilhas têm discrepâncias.
No caso de Junior, uma tabela aponta uma soma de R$ 3,2
milhões. Questionado pelo procurador sobre a divergência no valor informado,
ele disse que "infelizmente não fiz a análise crítica, mas pode ter
repetido".
As planilhas apresentadas por Junior, por sua vez, apontam
pagamentos no total de R$ 2,1 milhões e R$ 200 mil em "bônus", que,
segundo ele, seriam doação oficial.
No caso de Paschoal, a tabela inicial confirma repasses de
R$ 2 milhões. Nas planilhas, porém, o montante é de R$ 1,8 milhão –e R$ 200 mil
em "bônus".
A petição requerida pela Procuradoria foi acolhida pelo STF
no início de abril, mas, como os casos de outros seis governadores, ainda não
foi enviada ao Superior Tribunal de Justiça, órgão que julga os chefes do
Executivo estadual.
Segundo a Folha apurou, o ministro Edson Fachin, relator da
Operação Lava Jato no STF, determinou que as petições sejam entregues por
correio. No STJ, aguarda-se o recebimento de todos os casos para o exame de
cada um.
OUTRO LADO
A defesa de Benedicto Jr., ex-presidente da construtora
Odebrecht, disse que "pequenas divergências são absolutamente comuns e os
eventuais esclarecimentos podem ser feitos no decorrer da colaboração, que é um
processo contínuo de auxílio à Justiça".
A Odebrecht disse em nota que é responsabilidade da Justiça
a avaliação de relatos específicos feitos pelos seus executivos e
ex-executivos.
"A empresa está colaborando com a Justiça no Brasil e
nos países em que atua. Já reconheceu os seus erros, pediu desculpas públicas,
assinou um acordo de leniência com as autoridades brasileiras e da Suíça e com
o Departamento de Justiça dos EUA, e está comprometida a combater e não tolerar
a corrupção".
A defesa de Carlos Armando Paschoal não quis se manifestar.
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